Nossa Senhora dos anjos

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Nossa Senhora dos Anjos

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Carma do corpo, fala e mente





Carma do corpo, fala e mente

Carma é um termo sâns­cri­to que ori­gi­nal­men­te sig­ni­fi­ca­va “ação”. O carma é a lei universal de causa e efei­to que gover­na as ações inten­cio­nais. De acor­do com ela, todos os atos inten­cio­nais pro­du­zem resul­ta­dos, que mais cedo ou mais tarde serão sen­ti­dos por quem rea­li­zou a ação.

Boas ações pro­du­zem efei­tos cár­mi­cos posi­ti­vos, ao passo que os efeitos cár­mi­cos das más ações são nega­ti­vos. Essa lei opera em ­vários ­níveis: assim como os indi­ví­duos têm carma, tam­bém têm carma gru­pos e socie­da­des, paí­ses e até mesmo o pla­ne­ta Terra como um todo, tem um carma que pertence a todos os seres sen­cien­tes que o habi­tam.

Aliás, para ser mais específico, não é exatamente correto dizer que algo ou alguém “tem” um carma, uma vez que o carma é uma lei. Entretanto, é mais fácil falar do assun­to desse modo, evitan­do frases lon­gas que ­seriam tecnicamen­te mais pre­ci­sas.

 Dizendo que ­alguém “tem” um carma, que­re­mos dizer que sua vida está con­di­cio­na­da pela lei do carma, isto é, que as circunstân­cias pre­sen­tes devem ser com­preen­di­das como o resul­ta­do de seu comportamen­to pas­sa­do.

O con­cei­to de carma é fun­da­men­tal em todas as esco­las do budis­mo e em todas as interpre­ta­ções do Darma. É impos­sí­vel com­preen­der o budis­mo sem enten­der esse conceito em sua tota­li­da­de. O Buda clas­si­fi­cou o carma huma­no em três tipos:

  • carma gera­do pelo corpo;
  • carma gera­do pela fala;
  • carma gera­do pela mente.
 
Todas as ações intencionais do corpo, da fala e da mente geram resultados cármicos, que ocorrerão, inevitavelmente. Nem mesmo um Buda pode alterar a lei do carma.
Para a maio­ria das pes­soas, o carma fun­cio­na por repe­ti­ções cícli­cas. Deter­mi­na­da ação pro­po­si­tal gera um deter­mi­na­do resul­ta­do cár­mi­co, ao qual a pes­soa reage, o que leva a outro resul­ta­do cár­mi­co e assim suces­si­va­men­te.

 Desse modo, uma vida vai sendo construí­da conforme as rea­ções da pes­soa às con­di­ções que ela mesma cria. Reagindo ao próprio carma tan­tas e tan­tas vezes, vamos nos ato­lan­do na ilu­são.

O Buda disse que o ciclo de nas­ci­men­to e morte é uma ilu­são à qual nos aferramos por­que não con­se­gui­mos ver além dele. Ou seja, não sabe­mos como esca­par desse ciclo por­que não com­preen­de­mos seu fun­cio­na­men­to.

 Mais do que qual­quer outra coisa, é a lei do carma que man­tém os seres sencien­tes pre­sos nesse ciclo. E, mais do que qualquer coisa, é a lei do carma, se for bem com­preen­di­da, que levará os seres sen­cien­tes a se liber­tar do ciclo de nas­ci­men­to e morte.

Para os fins desta dis­cus­são, “mau” é aqui­lo que pre­ju­di­ca os seres sencien­tes, ao passo que “bom” é o que os auxi­lia. Más ações geram mau carma. Ações per­ver­sas produzem carma tão nega­ti­vo que levam a pes­soa a nas­cer em um dos três pla­nos mais bai­xos da exis­tên­cia (os mun­dos do inferno, dos espíritos famintos e dos ani­mais).

 O bom carma leva ao renascimen­to como ser huma­no ou celes­tial.

Carma é a força que “nos obri­ga a nas­cer, mesmo que não quei­ra­mos, e a mor­rer, mesmo que não quei­ra­mos”. Quando se fala do ciclo de nas­ci­men­to e morte, é impor­tan­te lem­brar que não é “você” que vai e volta nesse ciclo, e sim o seu carma. A ilu­são alimenta-se de si pró­pria atra­vés da lei do carma.
A prá­ti­ca budis­ta colo­ca muita ênfa­se nas boas ações, pois são as boas ações que, praticadas hoje, esta­be­le­ce­rão o ali­cer­ce de nossas vidas futu­ras. A maneira correta de compreender o carma é não se preo­cu­par com o que se está rece­ben­do hoje, mas com o que se está fazen­do hoje.

O carma é como o vento. O bom carma sopra os seres sen­cien­tes para ­locais aprazí­veis, onde experimentarão a alegria. O mau carma sopra os seres sencien­tes para luga­res desagra­dá­veis, onde experimentarão o sofrimento.
Artigos sobre o Significado do Maaiana

Tipos de Carma
 Em ter­mos ­gerais, o carma pode ser clas­si­fi­ca­do em três tipos bási­cos:
  • carma do corpo;
  • carma da fala;
  • carma da mente.

Sempre que uma inten­ção se forma na mente, esta­mos plan­tan­do uma semen­te de carma men­tal. As ações ins­pi­ra­das por aque­la inten­ção adi­cio­nam outras semen­tes à primei­ra.

Carma posi­ti­vo, carma nega­ti­vo e carma neu­tro 
Nossas ações podem gerar carma posi­ti­vo, nega­ti­vo ou neu­tro. O carma posi­ti­vo é gera­do pelas ações cujo pro­pó­si­to é aju­dar ­outros seres sen­cien­tes. O nega­ti­vo é gera­do pelos atos que têm por fina­li­da­de prejudicar os ­outros. O carma neu­tro é gera­do por ações não inten­cio­nais. Somente um Buda não cria nenhum tipo de carma.

Carma deter­mi­nan­te e carma deta­lha­do
 O carma deter­mi­nan­te, tam­bém cha­ma­do de “carma bási­co”, é aque­le que defi­ne se o ser nas­ce­rá como ani­mal, como ser huma­no, como espírito faminto e assim por dian­te. O carma deta­lha­do defi­ne o tipo de corpo que teremos, as cir­cuns­tân­cias da vida etc.

O carma deter­mi­nan­te defi­ne o reino em que nas­ce­re­mos, ao passo que o detalha­do preen­che as lacu­nas res­tan­tes. Por exem­plo, o carma determinante leva ­alguém a nas­cer como ser huma­no, enquanto que, o carma deta­lha­do esta­be­le­ce o tipo de corpo, a nacio­na­li­da­de e a família em que o ser vai nas­cer.

Carma compartilhado e carma indi­vi­dual
 O carma com­par­ti­lha­do é aque­le vivenciado por ­vários seres ao mesmo tempo. Por exem­plo, todos nós que vive­mos neste pla­ne­ta temos a Terra como parte de nosso carma compartilhado.

 O país e a ­região onde vive­mos é, também, parte do nosso carma compartilhado. As inunda­ções ou ter­re­mo­tos que podem ocor­rer em uma ­região são parte do carma compartilhado das pessoas que lá vivem.
O carma compartilhado pode ser visto de duas maneiras:

  • com­par­ti­lha­do por todos;
  • não com­par­ti­lha­do por todos.

Por exem­plo, caso uma área seja atin­gi­da por um ter­re­mo­to, todos os seus habi­tan­tes são de algu­ma forma afe­ta­dos pelo fato, sendo este um caso de “carma compartilha­do por todos”.

Entretanto, cada indi­ví­duo naque­la ­região será afe­ta­do pelo ter­re­mo­to de forma dife­ren­te: ­alguns fica­rão feri­dos; ­outros, não; alguns podem ter suas casas destruídas; ­outros, não. Este é o “carma não com­par­ti­lha­do por todos”.

O mesmo se apli­ca a um aci­den­te auto­mo­bi­lís­ti­co ou a qual­quer outro even­to que afete mais de uma pes­soa. Em um aci­den­te de carro, pode acontecer de uma pes­soa morrer e outra sair andan­do, ilesa. O carma individual ­inclui nos­sos talen­tos, personalidade, tendências, rea­ções característi­cas e tudo o mais que nos carac­te­ri­za como indi­ví­duos.

Carma pro­gra­ma­do e carma não pro­gra­ma­do
O carma pro­gra­ma­do é aque­le que acon­te­ce ine­vi­ta­vel­men­te em determi­na­da hora e local e não pode ser evi­ta­do de forma nenhu­ma. O não pro­gra­ma­do é tam­bém inevitável; contudo, quando e onde acontecerá não está pre­via­men­te deter­mi­na­do.

O poder do carma é incrí­vel. Sua influên­cia tem longo alcan­ce. Quando os fru­tos da retri­bui­ção esti­ve­rem madu­ros, não há onde se escon­der.
Vinaya (Coleção das Regras)

Os qua­tro tipos de carma
Esta clas­si­fi­ca­ção cons­ti­tui outra forma de com­preen­der o funcionamento do carma. Os qua­tro tipos, envolvendo as causas e os efeitos, são:

  • carma “escuro escuro”;
  • carma “claro claro”;
  • carma “escuro claro”;
  • carma “nem escuro nem claro”.

Carma escuro sig­ni­fi­ca mau carma. Uma vez que esse tipo de carma só gera sofrimento (um mau resultado), ele é cha­ma­do de carma “escuro escuro”. O carma claro é o bom e como só gera resul­ta­dos felizes (um bom resultado), é cha­ma­do de carma “claro claro”.

Carma “escuro claro” é uma mistu­ra de carma nega­ti­vo e posi­ti­vo gerando frutos híbridos (mau e bom). O carma “nem escuro nem claro” seria o carma neu­tro, que é o carma dos seres des­per­tos ou ilumina­dos, que transcenderam a duali­da­de de “mau e bom”, “escuro e claro” e, portan­to, não mais produ­zem frutos positivos ou nega­ti­vos. Seu carma é neutro: “nem claro nem escuro”.

O bom carma gera resul­ta­dos feli­zes, ao passo que o mau carma gera resultados infe­li­zes. O carma neu­tro pro­duz resul­ta­dos que não são feli­zes nem infe­li­zes.
Shastra Satyasiddhi (Tratado sobre a Completude da Verdade)

A Ordem em que Chega o Carma
A rela­ção entre causa, efei­to e lei cár­mi­ca é extre­ma­men­te com­ple­xa e difí­cil de ser compreen­di­da. Apesar disso, ela mos­tra uma ordem bási­ca que pode ser enten­di­da pelos seres huma­nos.

 É muito impor­tan­te ter algu­ma compreen­são a res­pei­to dessa ordem básica, por­que, sem isso, as pes­soas, frequentemente, ten­dem a cair na cren­ça de que o carma não exis­te.

Sem uma ideia clara sobre a ordem em que o carma chega, é fácil ver “boas pes­soas sofren­do morte peno­sa e pes­soas más des­fru­tan­do con­dições muito agradáveis” e daí con­cluir que não há jus­ti­ça no mundo e que algo como o carma não pode exis­tir.

Na ver­da­de, o carma chega em uma ordem mais ou menos defi­ni­da, que pode­mos distinguir em três ­níveis:

o pri­mei­ro nível é o do carma que é gera­do nesta vida e chega nesta vida
; o segun­do é o do carma gera­do nesta vida, mas chega na pró­xi­ma;
 o ter­cei­ro é o carma gera­do nesta vida que chega em alguma vida ­depois da pró­xi­ma.

 Esses dife­ren­tes ­níveis podem ser comparados a dife­ren­tes tipos de plan­tas. Há semen­tes que, se plan­ta­das na pri­ma­ve­ra, darão fru­tos no outo­no; ­outras podem demo­rar um ano ou mais para frutificar. Algumas árvo­res levam anos para dar fruto.

As ­razões pelas quais o carma pode che­gar em dife­ren­tes vidas são duas:

  • a causa do carma pode ser de gera­ção lenta ou rápi­da;
  • as con­di­ções do carma podem ser fra­cas ou for­tes.

As cau­sas cár­mi­cas podem ser de gera­ção lenta ou rápi­da, assim como há plan­tas que demo­ram muito ou pouco para fru­ti­fi­car. As con­di­ções podem ser for­tes ou fra­cas, assim como o ambien­te da semen­te. Se uma semen­te rápi­da rece­ber boa lumi­no­si­da­de e água sufi­cien­te, cres­ce­rá muito depres­sa. Já uma semen­te lenta man­ti­da no escu­ro tal­vez demore anos para bro­tar.

É por isso que mui­tas vezes vemos pes­soas boas sofre­rem horrivelmente. Nesta vida, elas têm sido boas, mas o carma de vidas pas­sa­das é forte e tem de fru­ti­fi­car.

 As causas que estão sendo plan­ta­das hoje são extrema­men­te impor­tan­tes; con­tu­do, nin­guém con­se­gue esca­par de ­colher o que foi plan­ta­do no pas­sa­do.

Da mesma forma, é comum ver pes­soas más usufruindo os pra­ze­res de uma vida bastan­te agra­dá­vel. As semen­tes que estão plan­tan­do hoje lhes trará sofri­men­to no futu­ro; antes de che­gar esse dia, porém, estão rece­ben­do os resul­ta­dos de boas ações que praticaram em uma vida pas­sa­da.
O carma obe­de­ce a dois prin­cí­pios fun­da­men­tais:

  • todas as semen­tes cár­mi­cas um dia darão fruto;
  • mau carma não pode ser trans­for­ma­do em bom carma.

O bom carma gera resul­ta­dos posi­ti­vos, e o mau carma pro­duz resultados negativos. Apesar de ser impos­sí­vel trans­for­mar mau carma em bom carma, é impor­tan­te compreender que seus efei­tos podem ser diluí­dos.
Se praticar­mos boas ações em gran­de quantidade, seus efei­tos vão ­diluir nosso mau carma, tor­nan­do-o mais supor­tá­vel. Assim como a água salga­da pode ser diluí­da com água-doce para que seu sabor fique mais palatá­vel, os efei­tos do mau carma podem ser ate­nua­dos adicionando-se a ele os efeitos de muitas boas ações praticadas.

Discutimos ­alguns aspec­tos bási­cos da lei do carma. Além deles, ­outros três fatores determi­nam a ordem e o rumo do carma:

  • sua gravi­da­de;
  • nos­sos hábi­tos;
  • nos­sos pen­sa­men­tos.

O carma muito sério, bom ou mau, chega antes do menos sério. Nossos hábi­tos são como sul­cos que deter­mi­nam os rumos da nossa vida. Os hábi­tos ado­ta­dos nesta vida exer­cem pode­ro­sa influên­cia na defi­ni­ção do tipo e da qua­li­da­de da pró­xi­ma vida.

Nossos pen­sa­men­tos estão cons­tan­te­men­te crian­do e recrian­do nossa vida. Os pensamentos levam a vida a fluir em dife­ren­tes dire­ções em dife­ren­tes momen­tos. O mutan­te curso dos pen­sa­men­tos às vezes se alte­ra sem moti­vo. Somos como ­alguém que sai para dar uma volta a pé.

Apesar de andar­mos sem des­ti­no pre­de­ter­mi­na­do, pre­ci­sa­mos deci­dir que rumo tomar a cada esquina. O curso dos pen­sa­men­tos pode ter uma influên­cia sutil, mas ampla, na vida. Um sim­ples pen­sa­men­to pode nos levar ao infer­no ou nos aproxi­mar do Buda.

Princípios e Expressões do Carma
Se o Buda disse que todos os fenô­me­nos são imper­ma­nen­tes, como pode o carma per­sis­tir ao longo de tan­tas vidas? Como pode ele ser cha­ma­do de lei invio­lá­vel? Para respon­der a essas per­gun­tas, o Buda com­pa­rou o carma a semen­tes e tam­bém a cos­tu­mes, ou caracterís­ti­cas per­sis­ten­tes.

A semen­te de uma plan­ta pode ser arma­ze­na­da por mui­tos anos, mas brota e se trans­for­ma em plan­ta, do mesmo tipo da anterior, assim que encontra as con­di­ções cor­re­tas.

 Da mesma forma, todos os nos­sos atos proposi­tais pro­du­zem semen­tes que ficam arma­ze­na­das em nossa consciência. Tão logo se apre­sen­tem as con­di­ções ade­qua­das, a semen­te brota e cres­ce.
O Buda disse que o carma é como o aroma, que con­ti­nua no fras­co mesmo ­depois de acaba­do o per­fu­me. Do mesmo modo, per­sis­tem os hábi­tos, as ten­dên­cias e o carma de uma vida, até a próxima vida.
Em suma, pode-se dizer que são três os aspec­tos mais fun­da­men­tais do carma:

  • A semen­te cár­mi­ca, uma vez pro­du­zi­da, não pode ser des­truí­da;
  • O resul­ta­do cár­mi­co de uma causa cármica será do mesmo tipo desta causa e cada um rece­be­rá os efei­tos de todas as cau­sas cár­mi­cas que gerou, e ape­nas dessas cau­sas;
  • O carma é a força que nos apri­sio­na ao ciclo de nas­ci­men­to e morte.

Onde quer que venha­mos a nas­cer, den­tre os seis rei­nos da exis­tên­cia – que são o mundo dos deu­ses (devas), o mundo dos semi­deu­ses (ashu­ras), o mundo dos seres humanos, o mundo dos espíritos famin­tos, o mundo dos ani­mais e o dos seres do inferno –, nosso carma sem­pre nos acom­pa­nha­rá. Nós mes­mos cria­mos nosso carma, e é impossí­vel evi­tar os efei­tos das cau­sas que colo­ca­mos em movi­men­to.

O carma é uma lei natu­ral, e não algo admi­nis­tra­do por deu­ses ou demô­nios. A flecha, uma vez ati­ra­da, não pode ser tra­zi­da de volta ao arco. Ao agir­mos intencionalmen­te, colocamos em ação for­ças que não mais podem ser can­ce­la­das. Um dia, os resul­ta­dos des­sas ações vol­ta­rão com o mesmo caráter e a mesma inten­si­da­de.

Uma vez com­preen­di­da a ver­da­dei­ra natu­re­za do carma, esta­mos em posi­ção de uti­li­zar essa pode­ro­sa força a nosso favor. O carma é uma lei. Não somos víti­mas dela, assim como não somos vítimas da lei da gra­vi­da­de. O obje­ti­vo do carma não é nos punir.

 Trata-se ape­nas de uma lei. Com essa compreen­são, não há por que temer o carma; devemos, sim, cui­dar de nos­sos atos intencionais, saben­do que eles são as cau­sas de nos­sas con­di­ções futuras.

Todos os seres sen­cien­tes são ­iguais peran­te a lei do carma
Cada um de nós rece­be ape­nas aqui­lo que deu. Se esses aspec­tos estive­rem cla­ros, deve estar óbvio que nos­sas maio­res espe­ran­ças estão no fun­cio­na­men­to do carma.

 Até mesmo um Buda é moldado de acor­do com a lei do carma. Boas inten­ções nos leva­rão rumo à budeidade, ao passo que más inten­ções nos afun­dam, mais profundamente, na ilusão.

O Buda sabe que todos os seres sen­cien­tes têm mui­tos dese­jos E sabe que todos estão pro­fun­da­men­te a estes, ape­ga­dos.
Assim, move-se com eles e lhes expli­ca o Darma, Utilizando mui­tos méto­dos dife­ren­tes, mui­tas pala­vras dife­ren­tes e mui­tas metáfo­ras diferentes.
Sutra Avatamsaka (Sutra da Guirlanda de Flores)

Observações sobre “Bem” e “Mal”
No budis­mo, as pala­vras “mal” e “mau” deno­tam aqui­lo que pre­ju­di­ca os seres sencientes. “Bem” e “bom” é aqui­lo que lhes ofe­re­ce auxí­lio e bene­fí­cio. Mau e mal são, por definição, o opos­to de bom e bem.

 O mal é aqui­lo que causa sofri­men­to. Má ação é qualquer ato que se opo­nha ao Darma, prejudique um ser sen­cien­te, seja ins­pi­ra­do por um dos três vene­nos – cobi­ça, raiva e igno­rân­cia – ou que fira um santo.
“Bondade” abran­ge aqui­lo que auxi­lia os seres sen­cien­tes e está em per­fei­ta concor­dân­cia com o Darma.

 As boas ações são sem­pre ins­pi­ra­das pela bon­da­de intrín­se­ca da pura nature­za búdi­ca inte­rior.
Na China, os budis­tas da esco­la Tiantai reco­nhe­cem seis tipos de bonda­de:

  • bon­da­de celes­tial;
  • bon­da­de infe­rior do Caminho Hinaiana;
  • bon­da­de infe­rior do bodisatva infe­rior;
  • bon­da­de infe­rior do bodisatva avan­ça­do;
  • bon­da­de infe­rior do bodisatva não budis­ta;
  • bon­da­de do bodisatva budis­ta ple­na­men­te des­per­to ou ilu­mi­na­do.

Uma breve aná­li­se des­sas seis dis­tin­ções pode aju­dar-nos a per­ce­ber melhor como a palavra “bom” deve ser com­preen­di­da no con­tex­to do budis­mo.

Bondade celes­tial que leva a más con­se­quên­cias. Uma pes­soa que obser­ve os Cinco Preceitos e pra­ti­que boas ações nesta vida, mas principalmen­te para bene­fí­cio próprio, renas­ce no paraí­so. Sua vida lá será longa e agradável, mas seu bom carma se esgo­ta­rá, e um dia ela poderá renascer em um dos três pla­nos infe­rio­res.

Bondade infe­rior do Cami­nho Hinaiana. Este segun­do tipo de bondade refe­re-se a prá­ti­cas budis­tas que con­si­de­ram a liber­ta­ção indi­vi­dual mais impor­tan­te que a dos outros seres sen­cien­tes. Essa tri­lha leva à liber­ta­ção da ilu­são, mas, já que não serve aos ­demais, é uma bon­da­de infe­rior.

Bondade infe­rior do bodisatva infe­rior. Trata-se da bon­da­de daque­le que tem com­pai­xão pelos ­outros e tenta ajudá-los, mas não con­se­gue supe­rar suas pró­prias impure­zas. Pessoas assim podem cau­sar mais mal do que bem.
Bondade infe­rior do bodisatva avan­ça­do. Aqui, ­incluem-se as ações daque­les que supe­ra­ram a maio­ria de suas imper­fei­ções, mas ainda permanecem ilu­di­dos com alguns aspec­tos da dua­li­da­de. Pessoas assim não con­se­guem valo­ri­zar a qua­li­da­de do cami­nho do meio segui­do por não budis­tas e, por­tan­to, ainda são afli­gi­dos por um conside­rá­vel grau de igno­rân­cia.

Bondade infe­rior de bodisatvas não budis­tas. Este, que é o quin­to tipo de bondade, diz res­pei­to às pes­soas que reco­nhe­cem a impor­tân­cia de aju­dar os ­outros, mas ainda não com­preen­dem os ensi­na­men­tos do Buda em sua tota­li­da­de. Portanto, ape­sar de serem boas, ainda come­tem erros.
Bondade do bodisatva budis­ta ple­na­men­te desperto. Essa é a bonda­de dos que com­preen­dem as ver­da­des dos ensi­na­men­tos do Buda em sua tota­li­da­de e agem com base nelas em todas as cir­cuns­tân­cias. Alcançar esse está­gio de ilu­mi­na­ção é deno­mi­na­do “bem”. Aferrar-se a esse esta­do ou aban­do­ná-lo é cha­ma­do “mal”.

Era uma vez um homem que esta­va cami­nhan­do e ficou com sede. Ele viu uma fonte brotan­do junto a um tron­co, cur­vou-se e bebeu até ficar sacia­do. Depois de matar a sede, levan­tou a mão e disse para a fonte: “Já estou satisfeito, pode parar de fluir”.

A fonte, é claro, não deu ouvidos àque­las pala­vras e continuou a fluir como antes. O homem zan­gou-se e repe­tiu: “Já disse que ter­mi­nei de beber e que você pode parar de fluir. Por que continua a fluir?”

Uma pes­soa que esta­va perto assis­tiu à cena e disse: “Você é mesmo um tolo. Por que fica mandan­do a água parar de fluir? Por que não vai embo­ra?”.

Neste mundo, as pes­soas ­comuns são como o tolo da his­tó­ria. Bebem os desejos dos sentidos até a sacie­da­de e, quan­do se can­sam, dizem: “Basta! Mundo dos sen­ti­dos, por favor, vá embo­ra. Já me far­tei!” O mundo dos sen­ti­dos, é claro, nunca lhes dá ouvi­dos e simplesmen­te con­ti­nua a fluir, enquan­to as pessoas rea­gem recla­man­do: “Eu lhe disse para ir embo­ra! Por que você fica me seguin­do o tempo todo? Cansei de você!”

Diante disso, o sábio comen­ta­ria: “Se você quer que suas pai­xões cessem, é você que deve abandoná-las, pois elas nunca toma­rão essa ini­cia­ti­va. Quando você tiver apren­dido a não se apegar aos senti­dos, suas ilusões diminuirão e você encon­tra­rá a liber­ta­ção de todos os seus desejos tolos”.

A maio­ria das pes­soas não ouve tais con­se­lhos. Pelo con­trá­rio, permane­ce agindo como o homem da nossa his­tó­ria: farto de beber, manda a água parar de fluir.
Sutra das Cem Parábolas

Capítulo 3 do livro Budismo Significados Profundos, Venerável Mestre Hsing Yün,
Escrituras Editora, 2ª edição revisada e ampliada, São Paulo, dezembro de 20


Capítulo 3 do livro Budismo Significados Profundos, Venerável Mestre Hsing Yün,
Escrituras Editora, 2ª edição revisada e ampliada, São Paulo, dezembro de 2011. REV141212



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